"Poderíamos aqui meditar sobre como seria saudável também para a nossa sociedade atual se num dia as famílias permanecessem juntas, tornassem o lar como casa e como realização da comunhão no repouso de Deus" (Papa Bento XVI, Citação do livro Jesus de Nazaré, Trad. José Jacinto Ferreira de Farias, SCJ, São Paulo: Ed. Planeta, 2007, p. 106)

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

De pai para filho, de geração em geração

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Artigo do cardeal Odilo Pedro Scherer

SÃO PAULO, sexta-feira, 14 de agosto de 2009 (ZENIT.org).

- Publicamos o artigo do arcebispo de São Paulo, cardeal Odilo Pedro Scherer, intitulado “De pai para filho, de geração em geração”, escrito no contexto da Semana da Família no Brasil. O texto foi veiculado na edição desta semana do jornal O São Paulo.* * *

Com o Dia dos Pais, inicia-se a Semana da Família no Brasil. A Igreja entende que o casamento é uma vocação e a família, uma grande bênção para as pessoas e toda a humanidade. Aliás, vale lembrar que foi a primeira bênção pronunciada sobre este mundo, logo após a criação do homem e da mulher; e não por um ser humano, mas pelo próprio Criador: “e Deus os abençoou” (Gn 1,28). Bênção maravilhosa!

Na família, geralmente, a atenção maior recai sobre a mãe e os filhos; o pai fica meio esquecido. Por isso, ao apresentar os parabéns aos pais, pela passagem do seu dia, desejo dedicar-lhes estas reflexões. Não como antropólogo, estudioso dos problemas sociais ou psicólogo familiar, mas como bispo e pastor, partindo dos ensinamentos de nossa fé cristã. Gosto muito da passagem da Carta aos Efésios, onde o autor manifesta seu vivo desejo de que os fiéis de Éfeso tenham uma profunda experiência do amor de Deus, revelado ao mundo por meio de Jesus Cristo: “por essa razão, dobro os meus joelhos diante do Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, do qual recebe o nome toda paternidade no céu e na terra” (Ef 3,21). Deus é pai amoroso e nele tem sua origem toda paternidade na terra!

Por isso, toda verdadeira paternidade tem algo a ver com a paternidade de Deus, que é criadora e geradora da vida, ação amorosa e providente para nutrir a vida e cuidar com ternura e vigor da criatura frágil; é ação educadora e estimuladora, para que a vida se encaminhe bem e alcance a plenitude e seu verdadeiro objetivo. Assim faz o Pai do céu; assim também seria o bom desempenho de toda paternidade na terra. Infelizmente, muitas vezes, a paternidade do homem está muito longe de retratar a paternidade divina. A Igreja convida os pais a crescerem na sua missão e os quer ajudar.
A Conferência de Aparecida reservou alguns parágrafos interessantes ao papel do homem e do pai de família na ação missionária da Igreja; nunca tinha acontecido antes que um documento da Igreja se dirigisse assim tão diretamente aos varões. Naturalmente, a palavra é dirigida ao homem cristão e católico. Como discípulo e missionário de Jesus Cristo, ele é chamado por Deus a ocupar seu papel próprio e indispensável em todos os âmbitos onde exerce suas responsabilidades sociais e profissionais (cf Doc. Aparecida, nn. 459-463). De modo especial, na família e na educação dos filhos, ele não deve deixar tudo à mulher ou à esposa; seu papel de varão e de pai é fundamental para a educação e o equilibrado amadurecimento da personalidade dos filhos. A presença fraca do pai, sua ausência ou, pior ainda, sua imagem negativa, deixa marcas na personalidade dos filhos e pode comprometer a formação deles para a vida.

Lançando um olhar sobre toda a América Latina, os bispos reunidos em Aparecida, em maio de 2007, lamentavam que, tradicionalmente, muitos homens se mantêm distantes da Igreja e do compromisso que nela são chamados a assumir; desse modo, vão se afastando de Jesus Cristo e da vida plena que tanto desejam e procuram; e os bispos apontavam para algumas conseqüências dessa falta de comprometimento do varão na tarefa educadora da família e nos rumos da convivência social: a proliferação dos vícios, como a droga e o álcool, a violência e a afirmação de certa maneira materialista de viver, onde contam sobretudo os bens materiais e o gozo imediato da vida. Sem falar da sobrecarga das mulheres nas responsabilidades familiares e educativas. A própria ação pastoral da Igreja precisa ser repensada, buscando maior envolvimento do homem na vida e na missão da comunidade eclesial.


O pai também tem uma missão importante na educação religiosa dos filhos. Sua palavra oportuna e, sobretudo, seu exemplo, cai fundo no coração dos filhos. Ele também é catequista para seus filhos. Lembro um texto bonito da Bíblia, no Deuteronômio: depois da libertação da escravidão no Egito, graças à intervenção de Deus, Moisés recomenda ao povo de Israel que nunca esqueça as maravilhas realizadas pelo Senhor e seus mandamentos: “trarás gravadas em teu coração todas estas palavras que hoje te ordeno; tu as repetirás com insistência aos teus filhos e delas falarás quando estiveres sentado em tua casa, ou andando pelos caminhos; quando deitares ou quando levantares” (Dt 6,6-7). Assim faziam os filhos de Abraão, de geração em geração. Era, sobretudo, missão do pai. Assim também fizeram os discípulos missionários de Jesus Cristo ao longo da história, antes de nós. E, ainda hoje, o pai cristão é convidado a fazer o mesmo: contar aos filhos as maravilhas de Deus, falar da experiência da própria fé, das coisas bonitas do Evangelho de Cristo e das riquezas da vida da Igreja. De geração em geração. É semear a boa semente em campo fértil e esperar o fruto chegar. Com a bênção de Deus!

Cardeal Odilo P. Scherer
Arcebispo de São Paulo

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